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O PIUM filmes é um movimento em prol do cinema. Somos núcleo do Cinema Possível no Amapá. “Para nós, cinema é uma coisa prática e feita de forma possível dentro das circunstâncias em que o cineasta está envolvido e, portanto, fazedor do espetáculo. Ele cria o seu próprio olhar, a partir de sua tela de convivência dentro da comunidade e/ou ciclo em que vive.Usamos o termo ‘CINEMA POSSÍVEL’ como extensão de nosso pensar no que tange à necessidade de comunicação abrangente, utilizando formas diferenciadas, inovadoras e criativas de contar uma história.” Jiddu Saldanha (Guru do PIUM FILMES)

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Cinema e Literatura: artes integradas



Participamos nos dias 05 e 06 de Setembro da Oficina "O Cinema Italiano e suas relações com a Literatura", ministrada pelo Professor Doutor Mauro Porru da UFBA. Especialista em Luchino Visconti, Mauro nos fez compreender que em tempos atuais, definitivamente, estão superadas as discussões assentadas na questão "o que é melhor: o filme ou o livro?".


Mauro Porru também agraciou-nos com o convite feito a sua amiga e colaboradora  Renata Franceschi, assistente de direção de Luchino Visconti, que esteve conosco no dia 05.09 e nos contou detalhes da filmografia desse monumental diretor.

O generoso professor, a quem agradecemos muitíssimo, repassou-nos seus apontamentos para  esta postagem.

CINEMA/LITERATURA – Apontamentos
Mauro Porru

As estreitas ligações do cinema com a literatura remontam aos seus primórdios.

Até o final dos anos '50, as relações entre cinema e literatura eram examinadas pela crítica visando evidenciar, principalmente, as diferenças entre estes dois campos expressivos.

Nos anos '60 nasce uma nova linha de debate baseada nos estudos de Roland Bartes (Sul cinema, Il melograno, Genova, 1994), Greimas (Del senso 2, Narrativa, modalità , passioni, Bompiani, Milano, 1995) e, especialmente, na semiologia do cinema, formulada e praticada por C. Metz (Semiologia del cinema, Garzanti, Milano, 1972), na qual procura-se estabelecer uma equivalência entre a linguagem literária e a cinematográfica.

Na Itália, estas indagações são desenvolvidas, nos anos '60 e '70, por Bettettini (Cinema, lingua e scrittura, Bompiani, Milano, 1968), Eco (La stuttura assente, Bompiani,Milano, 1968) Pasolini (Empirismo eretico, Garzanti, Milano, 1972). Porém, essas investigações conduzem, mais do que a uma equivalência entre a linguagem literária e a fílmica, à possibilidade de analisar um filme a partir da linguagem literária como modelo analógico, por ser a literatura, entre os fenômenos artísticos próximos ao do cinema, o que mais lhe assemelha no que diz respeito à percepção, à possibilidade de identificação do leitor/espectador com a história, as personagens, etc., e, também, por ambos nascerem de um conjunto de fatos escritos (o roteiro que procura a priori o seu correspondente na imagem fílmica).

Sobre esse último ponto, merece ser aprofundada a reflexão pasoliniana que não se limita à simples análise estrutural do produto cinematográfico, mas abrange todo o processo de produção do filme, privilegiando o roteiro como escrita na ausência de imagens cinematográficas.

Suas análises, efetuadas como escritor e cineasta ao mesmo tempo, o levam a vislumbrar na relação roteiro-filme uma forma de simbiose entre literatura e cinema. Identificando o roteiro como "estrutura que quer ser outra estrutura" (Empirismo erético, pag. 192- Garzanti) Pasolini elimina, definitivamente, as diferenças entre esses dois campos de indagação.

O cinema é literatura e a literatura é cinema e as relações entre as duas formas expressivas se desenvolvem em um terreno de intercâmbio mútuo. O roteiro começa a ser parte integrante do processo fílmico como descrição/representação concreta de imagens mentais, modificando muitos aspectos da questão.

De fato, o relacionamennto cinema/literatura, antes foi sempre observado como o encontro entre texto literário preexistente e independente de qualquer futuro projeto e sua realização enquanto linguagem de "imagens em movimento". Disso nasciam as preocupações dos críticos diante da adaptação cinematográfica de um romance, a respeito da fidelidade das imagens ao texto escrito.

A intervenção de Pasolini modifica os termos do problema e suas perspectivas, colocando os dois termos do debate em um plano de absoluta igualdade, ou melhor, de interação absoluta, e ressaltando, neste contexto, a fundamental importância do roteiro que funciona como um verdadeiro canal de transmutação.

A relação entre cinema e literatura não é mais um simples contato entre obra literária e filme, mas o contato entre obra literária, adaptação, roteiro e filme, num processo de lenta tranformação da abstração em concretos elementos visuais. O roteiro torna-se uma escrita atípica não conceitual, escrita pré-visual que quer se tornar escrita visual, porque tudo, no roteiro, é feito em função de elementos concretos, isto é, em uma base visual.

Estudos mais recentes focalizam a relação cinema/literatura do ponto de vista da tradução intersemiotica. Entre eles podemos citar o brilhante texto de Nicola Dusi “Il cinema come traduzione” que faz uma apanhado geral desses estudos, fornecendo uma rica bibliografia. Em português, temos o texto de Julio Plaza “Tradução Intersemiótica”, editado pela editora Perspectiva. Para Plaza a Tradução Intersemiótica, sendo uma tradução entre diferentes sistemas de signos, torna relevantes as relações entre os sentidos, meios e códigos. Quando se pensa na TI como transcrição de formas, visa-se penetrar pelas entranhas dos diferentes signos, buscando iluminar suas relações estruturais, pois são essas as relações que mais interessam quando se trata de focalizar os procedimentos que regem a tradução.

A Tradução Intersemiótica se pauta, então, pelo uso material dos suportes, cujas qualidades e estruturas são os interpretantes dos signos que absorvem, servindo como interfaces. Sendo assim, o operador tradutor é mais do que a “interpretação dos signos linguísticos por outros não-linguísticos”. A visão de Palza diz mais respeito às transmutações intersígnicas do que exclusivamente à passagem de signos lingüísticos para não-lingüísticos. (2001:67).

Particularmente, interessante é a análise daquele texto de passagem que é a adaptação de um romance preexistente, que como foi dito antes pode ser considerado também em termos de tradução. A relação entre um texto fílmico e seu correspondente literário deve ser colocado no âmbito de uma fita rede de relações intertextuais e intermidiáticas.

No fluxo constante do abstrato para o visual, neste processo de tensão pré-visual, a adaptação tem o papel essencial de selecionar o que conservar, eliminar ou acrescentar da obra literária no filme e de definir, com esta seleção, as intenções do roteirista no que diz respeito ao texto literário.

A adaptação de um texto literário para o cinema pode significar: ou representar uma obra literária reproduzindo simplesmente as ações e dando vida aos personagens sem se preocupar com o sentido do texto original, privilegiando critérios essencilamente comerciais, ou interpretar uma obra literária procurando descobrir o sentido intrínseco de uma linguagem para construir o mesmo sentido em uma outra linguagem, operando criticamente e culturalmente sobre os dois textos, (pre)vendo como a imagem possa restituir, modificar ou transfigurar o sentido da língua literária.

A relação entre cinema e literatura baseia-se em dois pressupostos objetivos: 1) o filme e o romance possuem elementos em comum; 2) o filme e o romance podem ser coligados através de alguns fenômenos que pertencem a um, mas que podem entrar também no território do outro.

Quando usamos o termo “conto”, de um ponto de vista literário, devemos ressaltar que este termo contém em si pelo menos dois significados diferentes: o de “estória”e o de “discurso”. Seguindo as orientações de Seymour Chatman entende-se por “estória” o conteúdo (ou seja a concatenação de eventos e de outros elementos como os personagens, ambientes etc), e por “discurso”: a expressão, os meios através dos quais é transmitido esse conteúdo. Para simplificar: a estória é o que é narrado e o discurso é como este conteúdo é narrado.

Os elementos centrais de um conto são: a causalidade, o tempo e o espaço. De fato, o conto nada mais é do que uma concatenação de eventos ligados entre si por uma relaçào de causa e efeito, que acontecem num determinado tempo e num deterninado espaço.

Atrás da noção de “conto” encontramos a noção de “narratividade” entendida como um conjunto de códigos, de procedimentos e operações, cuja presença num texto nos permite definí-lo como “conto”. Assim, a narratividade possui uma natureza virtual e pode existir concretamente só no momento que se torna “conto”. A relação que existe entre narratividade e conto substancialmente é a mesma que existe entre gramática e língua.

A narratividade é, portanto, aquele conjunto de regras, modos e estruturas profundas que se encontram na base de cada “conto” para que este possa acontecer através de enunciados verbais ou audiovisuais que nos contam a estória de personagens que se movimentam no espaço e no tempo seguindo uma determinada lógica causal. Desta forma, cada conto dá vida a um seu mundo habitado por personagens, lugares, tempos, eventos, sentimentos, objetos, palavras, barulhos, músicas, etc.

Esse mundo é o que a narratologia define como diegesis, termo que  Étienne Sorieau (L’univese filmique, 1953) deriva dos gregos (Aristóteles nos descreve a substancial diferença que existe entre o termo diegesis e o mais celebre de mimesis [μίμησις]; o primeiro expressa a natural narração de um conto, baseando-se no registro da autenticidade, o segundo a fictícia representação dos eventos), entendido como tudo o que pertence à estória contada e extradiegético tudo que não pertence a ela.

Todos esses conceitos podem ser repassados para a narração cinematográfica. Sua particularidade porém reside no fato que esta não se limita a narrar, mas mostrar também. E esse mostrar difere do mostrar teatral onde a estória é exposta diretamente na frente do público, impedindo qualquer tipo de intervenção.

No cinema uma outra instância invisível pode intervir através da câmera, nos mostrando este mundo numa determinada maneira. Essa instância  possui mecanismos que permitem ao público, além de ver, sentir o que está vendo (o exemplo mais clássico é o do comento musical: elemento extradiegético que auxilia neste sentido).

O espaço no cinema
Este pode ser considerado, seja como espaço da estória, seja como o espaço do discurso. O primeiro é o espaço diegético (casas, montanhas, rios etc) e o segundo é o espaço que se cria na tela dependendo de como o espaço é articulado.
Tempo no cinema
O tempo é sempre no presente.
Elipse
A uma duração determinada de tempo da estória não corresponde nenhuma duração de tempo do discurso (o equivalente do silêncio textual) para eliminar os tempos mortos.

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